A Reforma Tributária é um dos temas mais debatidos da economia brasileira nos últimos anos. Após décadas de discussões e tentativas frustradas, em 2023 o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional nº 132, que redesenha profundamente a forma como os impostos sobre consumo são cobrados no país.
Em 2025, novas leis complementares, como a LC 214/2025, começaram a detalhar regras específicas. Entre elas, impactos diretos para alguns setores já a partir de 2026.
Muito além de ajustes técnicos, essa transformação promete alterar a rotina de empresas de todos os portes e segmentos, além de trazer novos desafios para pessoas físicas que atuam como investidores ou prestadores de serviços.
Para empresários, agricultores, profissionais liberais e agentes do mercado imobiliário, compreender as mudanças e se preparar desde já é essencial para garantir segurança jurídica e competitividade no futuro.
Este artigo analisa os principais pontos da Reforma Tributária, seu impacto nos negócios e os reflexos específicos em quatro setores atendidos pelo escritório Ceni de Oliveira Advogados: empresarial, agro, serviços e imobiliário.
Por que passamos por uma Reforma Tributária?
O sistema tributário brasileiro é frequentemente apontado como um dos mais complexos do mundo. Atualmente, empresas precisam lidar com uma multiplicidade de tributos, como PIS, Cofins, ISS, ICMS e IPI, cada um com regras próprias de apuração e cobrança. Isso gera:
• Custo elevado de conformidade: estima-se que as empresas brasileiras gastem mais de 1.500 horas por ano apenas para cumprir obrigações fiscais, de acordo com estudos do Banco Mundial;
• Insegurança jurídica: interpretações divergentes entre União, estados e municípios alimentam uma quantidade expressiva de litígios tributários;
• Guerra fiscal: a disputa entre entes federativos por investimentos já gerou distorções e renúncias fiscais bilionárias;
• Baixa competitividade: empresas nacionais enfrentam desvantagens quando competem em mercados internacionais por conta da carga de tributos.
A Reforma surge como resposta a esses gargalos, com três objetivos centrais: simplificação, neutralidade e transparência.
As principais mudanças da Reforma Tributária
Entre os pilares da reforma, destacam-se:
Criação do IVA Dual
Um dos pontos centrais é a criação do chamado IVA Dual. O termo “IVA” significa Imposto sobre Valor Agregado, modelo similar ao utilizado em países da União Europeia. O objetivo é simplificar a tributação sobre consumo.
Na prática, o sistema será dividido em dois tributos complementares:
1. Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS)
• Vai substituir o PIS e a Cofins, atuais tributos federais incidentes sobre o faturamento;
• Será de competência da União, com legislação uniforme em todo o território nacional.
2. Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)
• Vai substituir o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), que hoje possuem legislações diferentes e geram inúmeros conflitos;
• Terá gestão compartilhada por estados e municípios, mas com legislação única, acabando com a guerra fiscal baseada em benefícios de origem;
• A cobrança será feita no destino, ou seja, no local do consumo e não da produção.
Cashback
Um dos aspectos mais inovadores da Reforma Tributária é a criação de um sistema de devolução parcial de tributos para famílias de baixa renda, chamado de cashback.
A ideia é reduzir o impacto regressivo dos impostos sobre consumo, já que, proporcionalmente, pessoas com menor renda comprometem uma fatia maior de seu orçamento com bens e serviços essenciais.
Na prática, parte dos tributos pagos em itens básicos, como alimentação, energia e gás de cozinha, será devolvida diretamente ao consumidor de baixa renda, em um modelo de restituição automática.
Esse mecanismo tem dois efeitos importantes:
1. Justiça social: garante que o peso da tributação seja menor para quem ganha menos;
2. Estímulo ao consumo: famílias beneficiadas terão maior poder de compra, o que movimenta a economia.
Embora ainda dependa de regulamentação detalhada, o cashback coloca o Brasil em sintonia com políticas públicas de bem-estar adotadas em outros países.
Transição gradual até 2033
A implementação da Reforma Tributária não será imediata. Para evitar choques econômicos e dar tempo de adaptação a empresas e governos, foi desenhada uma fase de transição de sete anos.
O cronograma funciona assim:
• 2026 a 2028: entrada em vigor de alíquotas simbólicas do CBS e IBS, apenas para testes e ajustes;
• 2029 a 2032: período de regime compartilhado, em que os novos tributos coexistem com os antigos, de forma progressiva;
• 2033: extinção definitiva de PIS, Cofins, ICMS e ISS, com substituição total pelo IVA Dual.
Esse desenho busca por segurança jurídica e previsibilidade, mas também exige planejamento estratégico das empresas.
Sistemas de gestão, contratos de longo prazo e políticas de preços terão que ser adaptados gradualmente para evitar inconsistências durante a convivência dos dois modelos.
Ou seja, trata-se de uma maratona de adaptação. Organizações que começarem desde já terão mais tranquilidade no processo
Impactos gerais para os negócios
Embora cada setor sinta efeitos diferentes, há tendências comuns:
• Maior previsibilidade: com a unificação de regras, empresas poderão planejar investimentos de longo prazo;
• Simplificação contábil: redução de obrigações acessórias e unificação de bases de cálculo;
• Competitividade ampliada: harmonização com padrões globais tende a atrair investimentos estrangeiros;
• Curva de adaptação: exigirá ajustes em softwares, contratos e processos internos, especialmente entre 2026 e 2032.
Outro ponto importante é o fim de regimes especiais fragmentados. Muitos incentivos estaduais serão substituídos por regras uniformes, exigindo reavaliação da matriz de custos e da localização de unidades produtivas.
Impactos setoriais
A Reforma Tributária não afeta todos os setores da mesma maneira. A legislação prevê regras específicas e tratamentos diferenciados, que podem representar tanto riscos quanto oportunidades dependendo do modelo de negócio.
Para empresários e investidores, isso significa que não basta compreender a lógica macroeconômica da Reforma: é preciso avaliar os impactos práticos dentro de cada segmento de atuação.
A seguir, destacamos como alguns dos principais setores atendidos pelo escritório Ceni de Oliveira Advogados — agro, serviços e imobiliário — serão influenciados pelas novas regras
Setor Agro
O agronegócio é um dos motores da economia brasileira e também será profundamente impactado nos seguintes aspectos:
• Exportações: continuarão desoneradas, o que garante competitividade internacional;
• Insumos agrícolas: poderão ter créditos tributários mais claros, reduzindo o efeito cumulativo de impostos;
• Benefícios específicos: alguns insumos e bens essenciais ao agro terão alíquotas reduzidas.
Por outro lado, há preocupação com a tributação de operações intermediárias, especialmente para pequenos produtores, que precisarão de apoio especializado para não perderem competitividade.
Prestadores de Serviços
Este é o setor que mais expressa apreensão em relação à Reforma.
• Muitos serviços hoje pagam apenas ISS (alíquota de 2% a 5%). Com a CBS + IBS, a alíquota total poderá superar 25% em alguns casos;
• Profissionais liberais e pequenas empresas podem enfrentar dificuldade em repassar integralmente esse custo ao cliente.
A tendência é que haja segmentação entre serviços de alto valor agregado e serviços massificados, com margens mais estreitas. Ferramentas de planejamento tributário serão essenciais para equilibrar custos e manter competitividade.
Setor Imobiliário
O setor imobiliário foi diretamente impactado pelas novas regras específicas nas seguintes frentes:
Locação de imóveis
• Passa a ser tributada também para pessoas físicas;
• Exceção: quem tem até dois imóveis alugados e renda anual inferior a R$ 240 mil;
• Para rendas acima de R$ 288 mil, o tributo incide independentemente da quantidade de imóveis.
Compra e venda
• Imóveis adquiridos há menos de cinco anos ou recém-construídos terão tributação de cerca de 14% sobre o lucro, com redutor de 50%;
• Para pessoas jurídicas, a regra é a mesma, mas sem faixa de isenção;
• Contratos residenciais firmados antes da LC 214/2025 podem optar pelo regime anterior até 2028;
• Entre 2026 e 2032 haverá alíquotas progressivas até a substituição completa do sistema.
Locações de temporada
• Redução de apenas 40% na base de cálculo, resultando em maior carga tributária;
• Para quem aluga por temporada em plataformas como Airbnb e Booking, a Reforma Tributária equipara a atividade a serviços de hospedagem, aplica alíquota efetiva maior (cerca de 15,9%) e reduz o benefício fiscal em relação à locação comum, o que deve aumentar a carga tributária dos anfitriões a partir de 2026.
Essas mudanças exigem planejamento patrimonial, revisão contratual e assessoria jurídica especializada para reduzir riscos e aproveitar benefícios disponíveis.
Desafios e oportunidades
A Reforma Tributária representa uma das maiores transformações já vistas no ecossistema brasileiro de negócios.
• Desafios: curva de adaptação, investimento em tecnologia, revisão de contratos e reorganização empresarial.
• Oportunidades: simplificação tributária, segurança jurídica, aumento da competitividade e abertura para novos mercados.
Empresas que se anteciparem, revisando sua estrutura societária e contratual, estarão em vantagem no novo cenário.
Tendências futuras
A médio e longo prazo, a Reforma tende a:
• Alinhar o Brasil a sistemas tributários internacionais;
• Ampliar a atração de investimentos externos;
• Reduzir litígios tributários, hoje um dos maiores entraves jurídicos do país;
• Estimular o ambiente de negócios com maior previsibilidade.
No entanto, o sucesso da implementação dependerá da regulamentação final, da capacidade de adaptação dos contribuintes e da eficiência da administração tributária.
Conclusão
A Reforma Tributária marca uma virada de página para a economia brasileira. Embora traga desafios relevantes, sobretudo para o setor de serviços e o mercado imobiliário, abre também um horizonte de maior simplificação e transparência para empresas e investidores.
Preparar-se desde já é a melhor estratégia: revisar contratos, repensar modelos de negócios e buscar assessoria especializada. O futuro tributário já começou a ser desenhado, e quem agir antes terá grandes vantagens competitivas.
Para compreender de forma personalizada os impactos da Reforma Tributária no seu negócio, recomendamos buscar orientação profissional qualificada. O escritório Ceni de Oliveira Advogados está à disposição para dialogar e esclarecer dúvidas, sempre dentro dos limites éticos da advocacia.





